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Mulher de Fibra

22.9.10

No outro dia o meu pai dizia-me que por nunca me ter dado mimos em excesso é que eu me tinha tornado a mulher de fibra que sou hoje.

Na verdade, os meus pais nunca me trataram como uma criança. O meu pai era futebolista e passava a vida a treinar e a minha mãe trabalhava todo o dia. Puseram-me na Dona Zezinha, uma ama muito querida e lá passava os meus dias, até aos 5 anos, quando entrei para a primeira classe. A minha primeira memória de infância foi aos dois, quando um dia ela me pôs a fazer a sesta e eu, não tendo o meu papá cantor ao pé, cantei a minha própria canção de embalar até adormecer. Era o "Oceano" do Djavan.
Fui muito independente desde cedo. Aos 5 anos entrei para a escola primária e para a natação. Lembro-me de ir para a Piscina Municipal de Portimão completamente sozinha. Enquanto os balneários pululavam de pais que iam lavar as costas e os pipis às minhas colegas da natação, eu tomava duche sozinha. E olhem que não era fácil lavar o cabelo encarapinhado sozinha. Mas eu sempre me safei muito bem.
Não me tratavam como criança até mesmo nas conversas que tinham comigo. Aos 8 anos, ao ver-me a cantar desenfreada e em modo-metralhadora "Podes-não-saber-cantar-nem-sequer-assobiar-com-certeza-que-não-vais-desafinar-em-PLAYBACK", não só me ensinou sobre o fenómeno dos Milli Vanilli, que durante anos enganaram o mundo inteiro a cantarem em playback, só porque tinham bom aspecto, mas na realidade eram outros dois que cantavam, como me contou também a história do Carlos Paião. Que tinha sido enterrado vivo. E, muito enfático como sempre, o meu pai contou a uma menina de 8 anos facilmente impressionável que tinham aberto o caixão e o cadáver estava virado ao contrário e que a porta do caixão estava toda arranhada da parte de dentro. Escusado será dizer que tive pesadelos com mortos e caixões até sensivelmente aos meus 15 anos.
Aos 10 anos vi pela primeira e única vez o filme "Atracção Fatal" com a Glenn Close e o Michael Douglas. Ver a maluca da amante com uma faca a esvair-se em sangue e depois afogar-se na banheira ficou na minha cabeça. Por isso incomodam-me os filmes com o Michael Douglas. E Glenn Close, nem vê-la à frente. 
Foi na mesma altura em que vi o filme "O Corvo" e me fizeram o favor de contar que o Brandon Lee (o filho do Bruce) tinha morrido a meio das filmagens (e explicaram-me exactamente qual era a cena em que ele morreu), porque uma das pistolas tinha pólvora verdadeira. Homicídio ou acidente - nunca se descobriu. Mas fiquei traumatizada com a ideia que, mesmo nos filmes, há coisas que podem ser reais.
Por volta dos 11 anos o meu querido pai decidiu contar-me a história do O.J. Simpson, que já aqui mencionei. Contou-me que ele tinha assassinado a mulher e o amante. Quando lhe perguntei por que não tinha sido preso, lá me falou da história de aceitação dos negros nos Estados Unidos e da justiça que, por vezes, fecha os olhos. 
Por tudo isto, acho que fui crescendo com uma ideia demasiado real do que era o mundo. E hoje, aos 26 anos, poucas coisas me tiram o chão. A fibra? Essa vou tendo a cada dia mais.

 

3 comentários:

  1. ui menina! e que fibra! Mas ainda bem, assim podemos disfrutar de uma Rafaela inteira, cheia de génio e genica!

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  2. Ui, revi-me na história do Carlos Paião. Apesar de ser um pouco mais velha que tu, fiquei bastante impressionada e ainda hoje a história me causa arrepios...

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  3. Muito bom teu blog! :)

    Peguei uma foto emprestada para outro post! ^^

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